Sem fôlego, Nordeste cresce metade do Brasil

Por Ana Conceição 

O crescimento da economia nordestina ficou abaixo da média nacional em 2018 e o mesmo deve ocorrer neste ano, embora se espere uma aceleração significativa da atividade local em 2019. Com problemas estruturais antigos, que o levam a ter a maior parte dos empregos no mercado informal e ser mais dependente dos programas de transferências de recursos da União que outras regiões, o Nordeste ainda enfrentou problemas conjunturais, como uma seca histórica e o adiamento ou cancelamento de projetos de infraestrutura por causa da crise. 

Em 2018, o Produto Interno Bruto (PIB) nordestino cresceu 0,6%, quase metade da alta do produto do país, de 1,1% em 2018, segundo estimativa da Tendências Consultoria. 

Camila Saito, economista da área de análise setorial e inteligência de mercado da casa, lembra que o Nordeste cresceu mais que as outras regiões no boom econômico que durou até o início desta década, depois passou a sofrer os reflexos da recessão econômica de forma bem mais intensa que o resto do país e, agora, custa mais a sair da crise. Em 2015 e 2016, o PIB regional caiu 4% ao ano, em média, contra recuo nacional de 3,4%. 

“Isso se deve à baixa exposição da economia da região ao mercado externo, à 

alta dependência de transferências da União e à forte ressaca gerada pelos cancelamentos e adiamentos de grandes projetos”, afirma. O PIB nordestino responde por 14,3% da economia do país. 

Mais que o Centro-Oeste (10,1%) e o Norte (5,4%), menos que o Sul (17%) e o Sudeste (53,2%), segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O crescimento da economia da região empatou com o Centro-Oeste (0,6%), que tem uma economia basicamente voltada ao agronegócio, e foi menor que o desempenho das demais regiões: Norte (2,3%), Sul (1,3%) e Sudeste (1,1%). 

Com um peso muito relevante da estrutura estatal na economia fica mais difícil engatar uma recuperação, uma vez que a atual crise é essencialmente fiscal. “Os Estados estão quebrados e os que dependem mais de recursos públicos vão se recuperar mais lentamente”, diz Jorge Jatobá, sócio da Consultoria Econômica e Planejamento (Ceplan), de Recife. “As diferenças intrarregionais são grandes. Estados com economia mais dinâmica, como Pernambuco, devem se recuperar mais rápido”, diz. 

Dados setoriais do IBGE mostram que a maioria dos Estados nordestinos foi muito mal nos serviços, na indústria e no comércio em 2018. Poucos ficaram em linha ou acima da média nacional. Nos serviços, enquanto a queda média dessa atividade no país foi de 0,1%, nos maiores Estados da região – Pernambuco (-1%), Bahia (-3,3%), Ceará (-7,1%) – o recuo foi bem maior. Quedas expressivas também foram registradas no Rio Grande do Norte (-6,8%), Sergipe (-4,6%), Paraíba (-4,3%), Piauí (-3,2%), Alagoas (-3%), e em menor medida no Maranhão (-0,4%). 

No varejo ampliado, o crescimento das vendas ficou abaixo da média nacional, de 5%, também nos principais Estados, Pernambuco (1,7%), Bahia (1,5%) e Ceará (2,7%). Na indústria, que cresceu 1,1% no país em 2018, Bahia (0,8%) e Ceará (0,4%) avançaram abaixo da média, enquanto Pernambuco cresceu 4,1%. A indústria do restante da região se expandiu apenas 0,2% no ano passado. 

Um indicador que evidencia o baque sofrido pela economia nordestina nos últimos anos é o aumento da proporção de famílias que vivem abaixo da linha de pobreza, observa Camila Saito. Segundo dados da Tendências, de 2014 a 2017, essa proporção aumentou 3,1 pontos percentuais no Nordeste, passando de 5,8% para 8,9% da população, sendo que na média brasileira foi de 3,2% para 4,8%, alta de 1,6 ponto percentual. A taxa de desemprego média na região – de 14,9% -, embora menor que a em 2017, é mais alta que a média nacional, de 12,3%. E ainda maior em Estados como Bahia (17%) e Pernambuco (16,7%). 

Jatobá, da Ceplan, lembra que o início da crise, em 2014, coincidiu com a conclusão de grandes empreendimentos na região, que desmobilizou milhares de trabalhadores que, depois, não conseguiram um novo emprego. “A informalidade, que já era alta, cresceu mais”, diz. 

Em 2019, o PIB nordestino deve crescer 1,9%, ante média de 2% no país, estima a consultoria. A Ceplan estima alta de 2,2% para o Nordeste, mas o dado está sob revisão. Se os números da Tendências se realizarem, a média de crescimento do período 2017-2019 seria de 1% no Nordeste, ante 1,4% no país. 

Essa retomada mais lenta na região se deve, na avaliação da economista, ao peso relativamente modesto dos setores mais sensíveis ao crescimento, como o automotivo, de máquinas e equipamentos e material de construção. A carência de grandes projetos de investimentos previstos para entrar em operação no curto prazo também pesa. 

Embora neste ano a perspectiva seja de que o ritmo da economia local se aproxime da média nacional, o nível do PIB local deve ficar ainda longe do patamar pré-crise. As estimativas da Tendências são de que em 2019 o PIB nacional ainda estará 2,7% abaixo do nível registrado em 2014, enquanto no Nordeste, a diferença deverá ser de -4,7%, a maior distância entre todas as regiões, sendo que espera-se que apenas o Norte supere este patamar (0,6%). 

“O Nordeste deve demorar mais que as demais regiões para retomar os níveis pré-crise. Porém, olhando mais para o médio e longo prazos, as perspectivas são mais favoráveis para a região”, afirma Camila. Em sua análise, a partir de 2020, o desempenho do Nordeste deve ganhar mais tração. “Melhorias importantes da infraestrutura, além de investimentos produtivos, como em gás/petróleo, bem como boas perspectivas para o turismo e agropecuária da região devem sustentar um bom dinamismo para a economia nordestina nos próximos anos”, afirma. No quesito infraestrutura, ela cita o desenvolvimento de aeroportos, portos, distribuição de energia elétrica, energia eólica/solar e ferrovias. 

Boa parte desses projetos é ligada ao programa de concessões do governo federal. Nesta semana há os leilões dos aeroportos de Recife (PE), Maceió (AL), Aracaju (SE), João Pessoa (PB), Campina Grande (PB) e Juazeiro do Norte (CE), para os quais estão previstos cerca de R$ 2 bilhões em investimentos. Também estão programadas as licitações de terminal no Porto de Cabedelo (PB) e no Porto de Suape (PE) e houve licitações recentes de terminais no Maranhão e na Bahia. A licitação da Fiol (Ferrovia de Integração Oeste-Leste) Bahia e a privatização das companhias de saneamento de Ceará, Pernambuco, Alagoas e Sergipe também estão na lista. 

“Além desses projetos, temos previsto um aumento expressivo do parque de energia eólica, que já representa 70% da matriz energética nordestina”, afirma Camila. Atualmente, há 472 parques instalados e outros 183 em construção, principalmente na Bahia, no Rio Grande do Norte e no Piauí. 

Jatobá, que também faz parte do conselho da regional da Câmara Americana de Comércio em Pernambuco, diz que o otimismo do empresariado nordestino é “discreto”. “Há um desejo de destravar investimentos, mas ainda há muita incerteza por causa da reforma da Previdência”, diz. 

Fonte: Valor Econômico

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